segunda-feira, 15 de julho de 2013

Desencarne e doação de órgãos

É possível que o espírito sofra, no mundo espiritual, com a doação de um órgão do cadáver dele? O que o Espiritismo diz sobre o transplante?


O Espiritismo é contra ou a favor da doação de órgãos?
          A doutrina espírita é inteiramente a favor de tudo o que promove o amor ao próximo. O Espiritismo é totalmente a favor, já que representa um avanço científico e visa o benefício e aperfeiçoamento dos seres em sua escalada evolutiva. É um ato fraterno e caridoso.
         Allan Kardec não mencionou nada sobre este assunto nas obras básicas da doutrina espírita, pois, na época da codificação, ainda não havia o transplante de órgãos. Porém, outros ilustres espíritas falam sobre a doação de órgãos para transplantes. Por exemplo, Divaldo Franco diz: "Se a Misericórdia divina nos confere uma organização física sadia, é justo e válido, depois de nos havermos utilizado desse patrimônio, oferecê-lo, graças às conquistas valiosas da Ciência e da tecnologia, aos que vieram em carência a fim de continuarem a jornada" (do livro Seara de Luz).
        O transplante de órgãos é uma das mais importantes conquistas científicas da atualidade. A doação pressupõe desprendimento, especificamente do corpo físico, dos quais o homem não passa de usuário eventual.
Em geral, as pessoas que são muito apegadas à matéria dificilmente se tornam doadoras de órgãos.
          Os espíritos superiores ensinam que o corpo é apenas um instrumento para o progresso do espírito imortal quando ele está na carne. Depois do desencarne, não há nenhuma razão para pensar no corpo carnal, que voltará a integrar-se na natureza pela decomposição. Porém, a grande maioria prefere não praticar o ato fraterno de doar seus órgãos ao seu semelhante, para doá-los aos vermes!

O desencarne
          Não tem como falar de doação de órgãos se não esclarecermos como é o processo de desencarne. Vejamos algumas questões de O Livro dos Espíritos:
          "Questão 154 - É dolorosa a separação da alma e do corpo?
Não; o corpo quase sempre sofre mais durante a vida do que no momento da morte; a alma nenhuma parte toma nisso. Os sofrimentos que algumas vezes se experimentam no instante da morte são um gozo para o Espírito, que vê chegar o termo do seu exílio. Na morte natural, a que sobrevém pelo esgotamento dos órgãos, em consequência da idade, o homem deixa a vida sem o perceber: é uma lâmpada que se apaga por falta de óleo.
          Questão 155 - Como se opera a separação da alma e do corpo?
Rompidos os laços que a retinham, a alma se desprende.
          Questão 155a - A separação se dá instantaneamente por brusca transição?
A alma se desprende gradualmente."
O Espírito se solta pouco a pouco dos laços que o prendiam. Estes laços se desatam, não se quebram.
          "Questão 164 - A perturbação que se segue à separação da alma e do corpo é do mesmo grau e da mesma duração para todos os Espíritos?
Não; depende da elevação de cada um. Aquele que já está purificado, se reconhece quase imediatamente, pois que se libertou da matéria antes que cessasse a vida do corpo, enquanto que o homem carnal, aquele cuja consciência ainda não está pura, guarda por muito mais tempo a impressão da matéria.
          Questão 165 - Muito variável é o tempo que dura a perturbação que se segue à morte. Pode ser de algumas horas, como também de muitos meses e até de muitos anos."
A perturbação que se segue à separação da alma e do corpo tem relação com a ligação que permanece entre o perispírito e o duplo etérico. No livro Obreiros de Vida Eterna, cap.13, o espírito André Luiz diz que, no processo de desencarne, primeiro se desfazem os laços fluídicos do centro vegetativo, depois os laços fluídicos do centro emocional e, finalmente, os laços fluídicos do centro mental.

Desenlace energético
          No caso das pessoas que viveram de forma equilibrada, sem cargas emocionais desajustadas, que sempre buscaram o esclarecimento e a harmonia interior, levando uma vida dedicada ao bem, o rompimento dos laços fluídicos que ligam o perispírito ao corpo é imediato à morte física. A pessoa não sente dor e nem sofrimento e também não passa pelo estado de perturbação, pois está totalmente desligada do corpo físico e do duplo etérico.
            Na questão 165, de O livro dos Espíritos, encontramos:
"A perturbação que se segue à morte nada tem de penosa para o homem do bem, que se conserva calmo, semelhante em tudo a quem acompanha as fases de um tranquilo despertar."
Portanto, após à morte física, não permanece ligação alguma entre o perispírito e o corpo físico.Todos os laços fluídicos se desfazem imediatamente.
           A diferença é a condição evolutiva da pessoa. Isso, sim, vai determinar o tipo de ligação mental e emocional que existirá entre o corpo e o espírito. Nas pessoas desequilibradas e apegadas à matéria, o desligamento dos laços fluídicos que unem o espírito ao corpo também é imediato à morte física, porém, seu perispírito permanece carregado de energias densas por um tempo maior. A pessoa experimenta algum tipo de sofrimento e também passa por um estado de perturbação, devido à permanência de uma certa ligação entre o perispírito e o duplo etérico. " Para aquele cuja consciência ainda não está pura, a perturbação é cheia de ansiedade e de angústias, que aumentam à proporção que ele da sua situação se dá conta." - O Livro dos Espíritos, questão 165.

Pessoas cruéis
           Esse tipo de pessoa experimenta muito sofrimento, podendo ficar "ligada" ao seu corpo físico, vivenciando todo o processo de decomposição. Também passa por estado de perturbação bastante acentuado. Porém, este sofrimento não é físico, é uma espécie de repercussão. Como não é completa a separação do corpo e do perispírito, uma espécie de repercussão moral se produz, transmitindo ao espírito o que está ocorrendo no corpo. É uma visão do que se passa com o corpo, ao qual ainda se conserva ligado ao perispírito e que lhe causa uma espécie de sensação de dor.
          Na questão 257 de O Livro dos Espíritos há o seguinte relato de um suicida:
" Não, não estou morto. No entanto, sinto os vermes a me roerem.
Ora, indubitavelmente, os vermes não lhe roíam o perispírito e ainda menos o Espírito; roíam-lhe apenas o corpo. Como, porém, não era completa a separação do corpo e do perispírito, uma espécie de repercussão moral se produzia, transmitindo ao espírito o que estava ocorrendo no corpo. Era, antes, a visão do que se passava com o corpo, ao qual ainda o conservava ligado o perispírito, o que lhe causava a ilusão, que ele tomava por realidade."
          Os assassinos e pervertidos também podem doar órgãos, porque o rompimento entre os laços fluídicos dos centros vegetativo e emocional é imediato à morte física, e estes laços fluídicos é que seriam os responsáveis pela sensação de dor. Porém, os órgãos desta pessoa devem estar impregnados de muita energia negativa, o que pode causar problemas de rejeição.

Energias no órgão
          É natural que as células materiais do órgão doado guardem, por algum tempo, uma certa "porção" de fluidos do perispírito ao qual esteve ligado.
Tão importante quanto o ato de doar os órgãos é doar um órgão em boas condições de uso. Por isso, temos que cuidar dos nossos pensamentos e sentimentos para não impregnar nossos órgãos com energias negativas. Temos de cuidar do corpo físico evitando excessos e vícios, que também podem danificar os órgãos. Fazendo uma analogia bem simples, quando doamos uma peça de roupa, ela ainda tem que ter condições de uso, caso contrário, estaremos nos livrando de algo inútil, um lixo, que estamos repassando para alguém. Assim cuidemos dos nossos corpo físico, cuidemos dos pensamentos e sentimentos, para que quando alguém for receber nossos órgãos, eles estejam em condições de uso ou diminuam a rejeição.
          Após o transplante, o órgão receberá, no novo corpo, uma fixação fluídica perispirítica de outra natureza. Poderá ocorrer um "choque", de maior ou menor intensidade, que perdurará por um certo tempo, até que sejam totalmente dissipadas do órgão doado as influências residuais dos fluidos perispirituais do espírito doador. Somente com altruísmo da parte do doador e com gratidão da parte do receptor essa discrepância vibratória tenderá a ser atenuada, sob supervisão de espíritos protetores, ocorrendo aquilo que o espírito André Luiz denomina de "vibrações compensadas".

Rejeição do órgão
          André Luiz considera a rejeição como um problema claramente compreensível, pois o centro de força do corpo espiritual do receptor perdeu momentaneamente a referência com o órgão transplantado.
Diz André Luiz: "O órgão perispiritual provoca os elementos da defensiva do corpo, que os recursos imunológicos em futuro próximo, naturalmente, vão suster ou coibir" (Revista Espírita, Allan Kardec, ano X, n*38).
          André Luiz explica que quando a célula é retirada da sua estrutura formadora, no corpo humano, indo laboratorialmente para outro ambiente energético, ela perde o comando mental que a orientava e passa, dessa forma, a individualizar-se; ao ser implantada em outro organismo (por transplante, por exemplo), tenderá a adaptar-se ao novo comando (espiritual) que a revitalizará e a seguir coordenará sua trajetória (Evolução em dois Mundos - Chico Xavier, pelo espírito André Luiz).
          Essa condição é corroborada pelo espírito Joanna de Angelis, quando expõe: "(...) transferido o órgão para outro corpo, automaticamente o perispírito do encarnado passa a influenciá-lo, moldando-o às suas necessidades, o que exigirá do paciente beneficiado a urgente transformação moral para melhor" - (Dias Gloriosos, Divaldo Franco).
A doação de órgãos é considerada um ato de alto valor moral, porém, a espiritualidade alerta para a necessidade de espontaneidade por parte do doador. Nada é obrigatório, pois devemos respeitar o livre-arbítrio.

O perispírito sofre?
          "Regra geral, o espírito desencarnado não sentirá dor, no sentido físico, pois a maioria estará em uma espécie de 'sono' nos momentos seguintes à desencarnação. Normalmente, o ato cirúrgico para retirada de órgãos não implica em dor para o espírito desencarnado. A agonia da morte impõe uma espécie de anestesia geral ao doente, com reflexos no espírito, que tende a dormir nos momentos cruciais da grande transição"-(Dr. Eurípedes Kühl).
          Sobre questão da situação do perispírito do doador quando da retirada de órgãos, Dr. Richard Simonetti diz o seguinte: "Nosso perispírito, o corpo espiritual, é afetado pelo que fazemos, não pelo que fazem ao nosso corpo" (Revista Internacional do Espiritismo, n* 01, ano LXXIII).
Casos de rejeição do órgão recebido podem ser atribuídos a duas causas principais de natureza espiritual:
1. Vibrações energéticas impregnadas no órgão doado.
2. Alteração do comando mental.

Doação de órgãos: um ato de amor
Por Victor Rebelo
          Infelizmente, o Brasil ainda tem baixíssimos índices de doações de órgãos. Apenas 50% dos potenciais doadores falecidos são notificados. Deste total, 20% se tornam doadores. Para mudar este quadro, será realizada uma campanha de conscientização para aumento do número de doadores.
          Na contramão, alguns espíritas são contra a ideia de doação de órgãos. Alguns dos argumentos usados é o de que o espírito, mesmo após a morte, pode vir a sofrer com a retirada dos órgãos do seu cadáver. Isso, na minha opinião, demonstra um conhecimento apenas parcial da doutrina espírita. Vejamos, apenas de passagem, alguns pontos:
            Como ocorre o processo do desencarne?
Após a morte física, os laços energéticos que uniam o espírito ao corpo material vão se desfazendo gradualmente. Porém, ainda que seja gradativo, uma vez iniciado o processo do desencarne é impossível o espírito voltar a "reencarnar" no mesmo corpo. Isso ocorre também com a morte cerebral.

Então, os órgãos do corpo já não servirão para mais nada...
          Exato. Entrarão em processo de decomposição e irão alimentar micro-organismos e vermes, ou então, poderá ser cremado. Por outro lado, numa atitude caridosa, podemos autorizar o transplante para que sirvam de instrumentos a um outro corpo físico, melhorando a qualidade de vida desta pessoa. Se for do merecimento dela, (Lei do Karma, ação e reação) haverá uma assimilação energética com o órgão recebido e o transplante será bem-sucedido.

Mas o espírito desencarnado não poderá sofrer?
          Talvez. Isso vai depender do apego material que esse espírito tiver com o corpo físico. Mesmo assim, o sofrimento será nada mais que uma impressão, ou, no máximo, uma repercussão energética. Geralmente não passa de um sofrimento moral, mas cada caso é um caso.
          O respeito e a gratidão que o doador irá receber pelo ato servirão como um bálsamo de energias amorosas. Sem contar que existem espíritos que ficam na retaguarda,dando apoio durante o processo.
Para finalizar, é importante deixar claro que a doutrina espírita não dita regras de comportamento, mas oferece diretrizes para a vida.